Estamos vivendo os primeiros dias de um novo ano, uma nova década, e é normal fazermos nossas listinhas de objetivos a serem alcançados ao longo do ano: ler determinados livros, matricular-se em uma academia, visitar tal lugar, mudar tal hábito e por aí vai.
Mas, ao final do ano, iremos perceber que nenhum desses itens da nossa lista, apesar de lícitos, nos preenche por dentro e desperta em nós o desejo pela eternidade, pois Deus colocou em nós o propósito ímpar de relacionar-se, aí sim, tudo fará sentido. Ao invés disso, não priorizamos ir profundo nos relacionamentos, porque relacionar-se dá muito trabalho e é “perigoso”, afinal, podemos nos machucar, não é mesmo? Geração “shallow now” não tem em sua lista: pedir perdão a quem magoei, visitar mais meu amigo, dizer que amo mais alguém, perdoar tal pessoa.
Fomos criados por Deus, com o DNA da eternidade, e cumprir o nosso propósito nessa vida nos traz esse senso. A eternidade obrigatoriamente passa pelos relacionamentos, afinal, Jesus trouxe o Reino de Deus e apresentou Seus valores através do relacionamento com os discípulos. Lembro que quando eu era criança e comecei a discernir sentimentos como alegria, amor, paz, através de relacionamentos com a família e amigos, que desejei intimamente, jamais deixar de vivê-los. Tinha medo de morrer e ir ao inferno, pois, na mente simples de criança sabia que não iria ter nada disso para sempre lá. Eu não tinha medo de Deus, pois sabia que Ele é amor. Tinha medo da privação eterna das facetas do amor. E ainda penso que aqui nessa vida, decidimos estar para sempre perto ou longe de Deus. Perto ou longe do amor para sempre! Glória a Deus por Jesus que nos deu o “acesso celeste” à eternidade junto a Deus e tudo que Ele é.
Mesmo como cristãos, muitas pessoas perdem essa alegria e vontade de viver, tornando-se religiosos, como “zumbis” sem vida, sem relacionamento com si próprias, com Deus através da Sua Palavra e do Espírito de Deus, e com relacionamentos destruídos com as pessoas. Essa cena é tão triste como comum.
Somos orientados por Deus a guardar o nosso coração, pois dele depende toda a nossa vida, mas com o tempo e correria, “baixamos a guarda” e somatizamos as decepções, colecionamos mágoas e ofensas e nos afastamos de nossa essência e das pessoas, nos isolamos. Isso vai exigir de nós uma postura constante: perdoar ou se afastar. Não escolhendo a primeira opção, somos sutilmente atraídos à direção contrária ao Espírito, e nos deixando para trás.
De fato, a decisão de viver no Espírito nos leva à tão sonhada e desejada paz:“Seguir o Espírito Santo conduz À vida e à paz, mas seguir à velha natureza leva à morte,” (Romanos 8.6) Bíblia Viva.
Não fomos criados para nos isolar. As obras da carne listadas em Gálatas 5.19-21, nos trazem dor, sofrimento, desconfiança, decepção, desesperança, pois desestruturam os relacionamentos que temos como base. Sem percebermos, caímos na armadilha da ofensa e mágoa e trilhamos uma vida de engano em busca da nossa eternidade, somente experimentada através de relacionamentos que gerem intimidade, em coisas superficiais. Posso citar o mau uso da internet: nunca as pessoas estiveram tão próximas umas das outras e tão superficialmente conectadas.
Jesus mudou a nossa natureza, nos fazendo justiça de Deus e nos reconectando à fonte. Não há condenação alguma sobre nós, temos plena capacidade de perdoar, externar e experimentar os frutos do Espírito, se decidirmos deixar a mágoa de lado e seguirmos para o amadurecimento. Sim, não o engano: crescer dói, mas é necessário. Precisamos decidir deixar de lado o que nos impede de estar vulneráveis à intimidade para assim, desfrutarmos constantemente da paz e alegria eternas.
Somos um corpo, temos interdependência. A restauração dos danos emocionais, psicológicos e físicos que sofremos só é possível através de relacionamentos com outras pessoas. Precisamos do que foi depositado por Deus na vida de cada um que convivemos. Para isso, não podemos oferecer resistência, orgulho e covardia. Precisamos ser humildes, pacientes, corajosos e vulneráveis ao reparo que o processo de confiar novamente e nos submeter nos oferece.
Já parou para pensar como o processo de cicatrização ocorre em nosso corpo? É um processo que tem ampla participação de várias células, eventos bioquímicos, ativação celular por mediadores químicos, ou seja, várias etapas complexas até a total restauração da área lesada em nosso corpo, como por exemplo o processo entre um corte e a cicatriz formada no local. Em suma, o processo de cicatrização está dividido em inflamação, formação de tecido de granulação e deposição de matriz extracelular e remodelação. É importante notar que a primeira fase, a inflamação tem como uma de suas características a dor. Assim como vemos a nível microscópico em nosso organismo, devemos trazer essa analogia para o Corpo de Cristo e aprendermos que somos interdependentes. Precisamos uns dos outros para sermos reparados pelo Espírito Santo.
“Do qual todo o corpo, bem ajustado, e ligado pelo auxílio de todas as juntas, segundo a justa operação de cada parte, faz o aumento do corpo, para sua edificação em amor” (Efésios 4.16).
Sempre será uma escolha, nos isolarmos ou nos relacionarmos para sermos curados e livres. Sim, esse processo dói, mas já vimos que faz parte da restauração, mas como toda cicatrização e reparo tecidual, em algum momento, se o processo não for interrompido, a cicatriz se forma e a dor some completamente. A cicatriz é para os humildes, fortes, maduros e que têm compromisso consigo e com o Senhor, e cada uma delas, conta a sua história de superação, como um troféu. Jesus possui as Suas.
Sim, queremos ser eternos! Mas isso demanda de nós o desejo autêntico de sermos como Deus é, pois Ele é Amor, e o amor nunca vai acabar. Não há força maior. A vida eterna está em se tornar íntimos e parecidos com Ele, à semelhança de Jesus. Por isso, vale pensar qual é a nossa real motivação ao longo dessa caminhada?
“Esta é a vida eterna: que te conheçam [perceber, tornar-se familiarizado e íntimo], o único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem enviaste” (João 17.3).
Quando nossa motivação estiver alinhada, a felicidade nos encontrará no caminho. Nos submeteremos ao processo de superação, confiantemente, e através do poder de Deus em nós, o caráter de Cristo se tornará cada vez mais visível em nós, através dos frutos do amor (Gálatas 5.22), e amadureceremos e consequentemente, a consciência eterna do reino de Deus será real. Não dá para pular isso! E apenas permanece nesse caminho, quem está disposto a colecionar as suas cicatrizes e seguir adiante, superando-se!