Doutor em Teologia pelo SETEC, Mestre em Sociologia pela UFPB, Bacharel em Direito pela UFCE, Graduado no Rhema e Escola de Ministros e Professor do Rhema. Contato: [email protected]
A Reforma Protestante está entre os acontecimentos incisivos da História. Tendo partido, principalmente, da região de língua alemã, foram promulgadas transformações que se inseriram profundamente na História mundial. Desde então, passou a existir, na cristandade, uma terceira divisão. Ou seja: além da que já existia entre Católicos Romanos e os Católicos Ortodoxos (Gregos), passou a haver a confissão protestante. Desde então, desenvolveram-se a liberdade de consciência do indivíduo e o conceito atual de profissão. O que aconteceu na época denomina-se, hoje, de Reforma Protestante.
Ela se iniciou como debate teológico, instigada decididamente pelo jovem monge Martinho Lutero (1483–1546), que era professor na província, na, então, recém fundada Universidade da cidadezinha de Wittenberg. Em outubro de 1517, ele enviou 95 teses, formuladas em latim, sobre questões teológicas, que ele – como era usual na época – desejava debater publicamente. Ele determinou, também, que tais teses fossem afixadas na porta da igreja Schlosskirche em Wittenberg. Isto gerou uma querela que, ao contrário da intenção de Lutero, levou ao cisma da Igreja de Roma e, após a sua morte, às chamadas guerras confessionais entre monarcas protestantes e católicos, resultando numa nova configuração do mapa europeu.
Lutero desenvolveu uma teologia própria, posteriormente denominada teologia evangélica, baseada nos textos do Evangelho. Tal teologia se voltava contra o papado e concentrava-se na fé de cada indivíduo. Ele abandonou sua ordem agostiniana, casou-se, traduziu a Bíblia para o alemão, redigiu um grande número de textos muito lidos – e criou, assim, o que são, agora, as igrejas evangélicas. Hoje, cerca de 37 % dos 2,2 bilhões de cristãos do mundo fazem parte de uma comunidade protestante.
Indiscutivelmente, a Reforma Protestante está entre os acontecimentos incisivos na História alemã, europeia e mundial. Ela marcou profundamente a consciência teológica, histórica, mental e política da Alemanha, da Europa e do Ocidente em geral. Ela influenciou tanto a língua alemã, como teve efeitos também sobre a música e a arte, dando impulsos importantes ao setor educacional e criando as bases para a participação social e política, para o conceito do cidadão emancipado.
Lutero imprimiu, em sua doutrina, muito de suas inquietações pessoais, especialmente a da insuficiência humana para obter qualquer favor divino. Contudo, suas críticas acerbadas contra a venda de indulgências, o papado e a tradução da Bíblia para o alemão ecoaram fortemente naquele mundo em transformação. Sua ênfase na doutrina da justificação pela fé também se coadunava com o crescente individualismo que incentivava a busca de uma espiritualidade menos dependente do clero e das restrições da Igreja. Sem a Reforma Protestante, o mundo seria inteiramente diferente em muitos aspectos pois o caminho de Lutero, de monge agostiniano a descobridor de uma liberdade de crença sem respeito a exigências institucionais, é visto, por muitos historiadores, como arquétipo existencial dos caminhos de libertação.
É válida a afirmação de que partiu, e ainda parte, de Lutero uma influente atuação histórica. Isto pode ser reconhecido exatamente na sua compreensão de liberdade (cristã). No seu texto “A Liberdade de um Cristão”, publicado em 1520, ele consagrou o pensamento de que cada cristão é um “senhor livre” sobre todas as coisas e não é súdito de ninguém; por outro lado, também é um “servo solícito” de todas as coisas e, assim, súdito de qualquer um. Com esta tese, Lutero faz a grave diferenciação entre pessoa “interna” e “externa”. Tal diferenciação é a base para uma teologia evangélica, que põe a fé no centro da cristandade (não as “obras”, não as “leis” e também não a Igreja), ou seja, nenhum dos fatores “externos” são decisivos para a salvação, mas apenas a fé e a misericórdia de Deus são determinantes.
Há muitos bons motivos para recordarmos a Reforma Protestante por ocasião de seu 500o aniversário da “divulgação das teses” – também porque ela foi uma importante revolução cultural e histórico-religiosa. Mas sobretudo, porque, através dela, podemos refletir a dimensão da atual dispensação em que vivemos, ou seja, a Dispensação da Graça, como sendo efetivamente a Dispensação do Espírito Santo tão bem compreendida pela Igreja Apostólica (Igreja Primitiva).
A reforma Protestante desencadeada por Lutero, em 1517, mudou a história da religião cristã, mas os investigadores destacam ainda o seu impacto na educação, particularmente nos países do centro e norte da Europa, que apostaram na alfabetização da população, contribuindo para que o saber ler fosse uma base prioritária para o conhecimento dos textos sagrados. A Reforma protestante conclama pilares e certas proposições teológicas famosas conhecidas como as Cinco “Solas”: Sola Fide (Somente a Fé), Sola Scriptura (Somente a Escritura), Solus Christus (Somente Cristo), Sola Gratia (Somente a Graça) e Soli Deo Gloria (Somente a Deus a Glória).
Sola Fide (Somente a Fé) – Contém a afirmação de que o homem é justificado, do início ao fim, única e exclusivamente, pela fé, sem qualquer acréscimo das obras (mérito humano) – já que é um dom (presente) de Deus, pois na cruz, os pecados dos homens foram lançados sobre Cristo, cumprindo, assim, a justiça de Deus. Esse é um ato de graça, por meio do qual Deus perdoa todos os nossos pecados e nos declara como justos diante de si, sendo suficiente a justiça de Cristo a nós imputada e recebida somente pela fé.
Solus Christus (Somente Cristo) – Essa proposição foi uma reação contra a igreja secularizada e contra os sacerdotes que se colocavam numa posição especial para mediar a graça e o perdão de Deus (através dos sacramentos e das indulgências). A Reforma defendeu que a mediação entre o homem e Deus é feita somente por Jesus Cristo, já que a salvação do pecador é uma obra exclusiva d’Ele.
Sola Scriptura (Somente a Escritura) – A cosmovisão reformada se funda no fato de que não há verdades concorrentes, mas que existe uma verdade absoluta fundada na Bíblia Sagrada. Dentro desse prisma, o princípio do Sola Scriptura afirma que a Bíblia Sagrada é a única regra de fé e prática do cristão – é onde se encontram os fundamentos da Teologia Cristã.
Sola Gratia (Somente a Graça) – Assim como a Igreja Protestante, a Igreja Católica também acredita que os cristãos são salvos pela graça (favor imerecido) de Deus. Mas apenas os reformados acreditam que o pecador é salvo somente pela graça de Deus. O Sola Gratia afirma que não há nada que possamos fazer para obtermos o favor de Deus, pois não temos mérito na nossa salvação, não cooperamos com Deus. A salvação é um dom, um presente, um favor que não merecemos do Deus. Paulo elucida bem esse fato em Efésios 2:1-9.
Soli Deo Gloria (Somente a Deus a Glória) – A Igreja Católica Romana ensina e exige a devoção ao clero, já que estes poderiam supostamente “mediar o perdão de pecados e a obtenção de benção aos homens”. Podemos notar isso na reverência e adoração ao Papa (sem entrar no mérito da idolatria aos santos!). A Reforma surge centralizando a glória e o louvor somente a Deus. Em Isaías 43:7, o Senhor nos mostra que formou o homem para a Sua glória. Paulo torna prático esse entendimento em Coríntios 10:31, aduzindo que quer comamos, quer bebamos, quer façamos qualquer outra coisa, devemos fazer tudo para a glória de Deus – não para nossa própria glória, não para glória de outros, mas somente para glória de Deus!
Como visto, o brado dos reformadores foi para que a Igreja voltasse ao cristianismo puro, simples e bíblico: que o cristão e a Igreja vivessem apenas pela fé, pautados apenas nas Escrituras, centralizados apenas em Cristo, vivendo apenas pela graça e dando glória somente a Deus!
Percebe-se como a Reforma não foi um desvio da Igreja, mas um resgate das verdades bíblicas acerca da salvação e da vida cristã. Que não foi uma inovação, mas uma restauração das verdades eternas, outrora obscurecidas pelas tradições humanas.